STJ: MINISTÉRIO PÚBLICO NÃO PODE REQUISITAR DADOS SIGILOSOS SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL

25/02/2022

A partir da resolução do Tema n. 990 pelo Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, no sentido de que “(...) é constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil - em que se define o lançamento do tributo - com os órgãos de persecução penal para fins criminais sem prévia autorização judicial, (...)” instaurou-se uma preocupação sobre a comunidade jurídica acerca da vigência ou não do direito ao sigilo de dados bancários e fiscais devidamente garantidos no texto constitucional, especificamente no art. 5º, da CRFB/1988.  


Em verdade, o Pretório Excelso não revogou tais garantias constitucionais, mas apenas aditou a orientação jurisprudencial anterior (vide RHC 57.750/RJ, DJe 14/06/2016) no sentido de que seriam ilícitas as provas anexadas em procedimentos investigatórios e processos criminais baseadas informações sigilosas obtidas por órgãos de controle, como a Receita Federal do Brasil e COAF, sem autorização judicial, cujo procedimento é autorizado pela Lei Complementar n. 105/01, desde que sejam observados os requisitos previstos no art. 6º do referido diploma, o qual teve sua constitucionalidade ratificada no julgamento da ADIN n. 2.859-DF.


A alteração de tal posicionamento do STF não transferiu às autoridades imbuídas de poderes investigativos a capacidade irrestrita de requisitar diretamente informações sigilosas aos órgãos de controle sem passar pelo controle jurisdicional, conforme devidamente esclarecido pelo STJ em recente julgamento proferido nos autos do RHC n. 83.233-SP.  


Segundo o Relator Ministro Sebastião Reis Junior “(...) a requisição ou o requerimento, de forma direta, pelo órgão da acusação à Receita Federal, com o fim de coletar indícios para subsidiar investigação ou instrução criminal, (...) não se encontra abarcada pela tese firmada no âmbito da repercussão geral em questão [Tema n. 990] (...)”.


No caso do precedente do STJ em comento, o órgão que tomou a iniciativa de acesso aos dados sigilosos (declarações de imposto sobre a renda dos investigados), sem autorização judicial, foi o próprio Ministério Público, cuja circunstância difere daquela autorizada pelo STF na qual a iniciativa do acesso a tais informações é dos órgãos de controle (COAF/IUF ou Receita Federal) que, posteriormente à conclusão do procedimento competente, transmitem às autoridades investigativas as informações coletadas, viabilizando a persecução penal.


Imperioso, por fim, reportar outro trecho do voto condutor do RHC n. 83.233-SP, no qual o Ministro Relator deixa claro que “(...) não é possível se admitir que órgãos de investigação, em procedimentos informais e não urgentes, solicitem informações detalhadas sobre indivíduos ou empresas, informações essas constitucionalmente protegidas, salvo autorização judicial (...)”, por ausência de previsão legal.


Portanto, foi confirmada a exigência de autorização judicial para fins de acesso a dados acobertados por sigilo fiscal e bancário, ao menos no que tange às investigações de natureza criminal iniciadas pelas autoridades policiais ou Ministério Público, as quais conservam o dever de justificar ao magistrado competente as motivações lícitas para violar tais garantias fundamentais.   


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Por Caio Alexandre Rosseto de Araujo